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"A opção fundamental da Vida de um Cristão é acreditar no Amor de Deus" Bento XVI

quarta-feira, 21 de março de 2012

Intervenção do Sr. D. António Couto no Dia do Seminário Maior de Lamego



Apresentação do livro "A Nova Evangelização, um desafio para sair da indiferença", de D. Rino Fisichella, no Seminário Maior de Lamego, a 19.03.2012, por ocasião da Solenidade de S. José

1. Na homilia da celebração das Primeiras Vésperas da Solenidade de São Pedro e São Paulo, celebradas na Basílica de São Paulo Fora de Muros, na tarde de 28 de Junho de 2010, o Papa Bento XVI deu a conhecer o seu propósito de criar, sob a forma de Conselho Pontifício, um novo organismo com a missão especial de promover uma renovada evangelização nos países onde já ressoou o primeiro anúncio do Evangelho, mas que, entretanto, esmoreceram na dinâmica e na vivência da sua fé.
2. Quase três meses depois, em 21 de Setembro de 2010 (Festa litúrgica de São Mateus), através da Carta Apostólica Ubicumque et semper, Bento XVI cria, para os efeitos já antes anunciados, o Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, e nomeia seu Presidente Mons. Rino Fisichella.
3. No seguimento dos grandes Documentos do Concílio II do Vaticano (Lumen Gentium, Gaudium et Spes, Sacrosanctum Concilium, Dei Verbum, Ad Gentes), e das grandes Encíclicas de Paulo VI e de João Paulo II (Evangelii Nuntiandi, Redemptoris Missio, e outras), Bento XVI vive com rara intensidade a questão premente da transmissão do Evangelho neste mundo em mudança. Tendo em conta a evidência de que a estrada que atravessa o Ocidente já foi uma estrada calcorreada quase na totalidade por Cristãos, e que hoje já o não é, e resvala para perigosos terrenos movediços que minam os cimentos da pessoa, da cultura, da fé, da família, da escola, da igreja, e praticamente de todas as instituições, Bento XVI não pode deixar de gritar a este mundo a pessoa de Cristo e o seu Evangelho.
4. A criação deste Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização é fruto desta preocupação de Bento XVI de imprimir à Igreja um novo impulso Missionário e Evangelizador.
5. Recordemos que, em termos de vocabulário, o Concílio I do Vaticano (1869-1870) usou uma única vez o termo «Evangelho», e nenhuma os termos «Evangelizar» e «Evangelização». O Concílio II do Vaticano (1962-1965), por sua vez, empregou o termo «Evangelho» por 157 vezes, «Evangelizar» por 18vezes, e «Evangelização» por 31 vezes.
6. Por sua vez, a expressão «Nova Evangelização» começou por se ouvir nos anos 70 na América Latina, ficando consagrada no famoso Documento de Puebla, de 1979. No âmbito do magistério papal, é João Paulo II que a usa pela primeira vez em Nova Huta (Polónia), em 09 de Junho de 1979. Emprega-a depois em Porto Príncipe (Haiti), na V Conferência do Episcopado Latino-Americano (V CELAM), em 09 de Março de 1983. É neste contexto que João Paulo II articula, pela primeira vez, a expressão «Nova Evangelização» com as expressões «novo ardor», «novos métodos», «novas expressões». Usá-la-á ainda, com grande relevo, na Encíclica Redemptoris Missio, n.º 33, onde distingue três situações diferentes no âmbito da missão da Igreja: a) a missão ad gentes, que se dirige àqueles que nunca ouviram o anúncio do Evangelho de Cristo; b) o cuidado pastoral da Igreja, que se dirige a comunidades cristãs vivas, testemunhais e dinâmicas, estabelecidas em bases sólidas; c) a nova evangelização, a levar a efeito em áreas de antiga tradição cristã, mas em que se perdeu o sentido vivo da fé, em que as pessoas não se reconhecem nem se querem ver como membros da Igreja, e vivem longe de Cristo e do seu Evangelho.
7. D. Rino Fisichella expõe, de forma clara e acessível, toda esta problemática, mas é de opinião que se ponha de lado, pelos equívocos que pode causar, o termo «reevangelização», usado como sinónimo de «nova evangelização» na Redemptoris Missio, n.º 33.
8. Acabei de filtrar os primeiros dois Capítulos do presente Livro de D. Rino Fisichella, que são de carácter introdutório e se intitulam respectivamente «Um desafio» (p. 5-20) e «A nova evangelização» (p. 21-31). Entenda-se: a nova evangelização constitui um desafio para D. Rino Fisichella e para a Igreja inteira, nesta hora de mudança epocal em que todas as certezas parecem resvalar não se sabe para onde, de tal modo que é hoje difícil apresentar, no domínio sócio-cultural, o simples «estado da questão» (status quaestionis), parecendo mais que nos devemos contentar com o «fluxo da questão» (fluxus quaestionis).
9. Parece-me que é o que D. Rino Fisichella pretendia fazer no Capítulo III, intitulado «O contexto» (p. 33-58), que enche com temas como o secularismo, a desorientação, a crise, o depois da crise, o contributo dos cristãos, o futuro. É, quanto a mim, um Capítulo frágil, em que a análise escorrega tanto como o chão escorregadio do fluxus quaestionis.
10. Acho imprescindível o tema do Capítulo IV, «Centralidade de Jesus Cristo» (p. 59-73). Mas gostaria de o ver tratado com mais ousadia e grandeza. Por que não abordar aqui o «estilo», o «modo», o «como» de Jesus, que é o essencial e o verdadeiramente necessário numa obra sobre a Nova Evangelização. Viria fora um estilo feliz, apaixonado, ousado, pobre, despojado, próximo e dedicado. Imprescindível fazer nosso este estilo nos caminhos da Nova Evangelização.
11. O Capítulo V intitula-se «Os lugares da nova evangelização» (p. 75-90). Considero-o um dos mais conseguidos. Os cinco «lugares» apontados são: a liturgia, com destaque para a homilia, a caridade, o ecumenismo, a imigração e a comunicação. Saliento o tom incisivo do tema da caridade, sobretudo quando Rino Fisichella apresenta o caso paradigmático de Blaise Pascal. Por aqui se vê também a importância dos exemplos e da imagem. Revela D. Rino Fisichella que, tendo caído gravemente doente, Pascal pediu os últimos sacramentos, mas que lhe foi recusado o viático, que é a última comunhão que se dá aos doentes, porque Pascal era jansenista. Pascal terá pedido então para ser levado para o hospital dos Miserables, dos mais pobres, para comungar a destino dos pobres com quem Cristo se identifica, já que não o podia comungar sob as espécies eucarísticas. Também este pedido lhe foi negado, dado que Pascal era nobre. Pascal pediu então com insistência que, ao menos, pusessem um pobre perto da sua cama, para nele poder contemplar Cristo. Também esta vontade lhe foi negada. E foi mesmo só no fim da sua vida que pôde receber a sagrada comunhão e morrer em paz com a Igreja. Este quadro fantástico encontra-se nas p. 83-84.
12. O Capítulo VI intitula-se «As perspectivas» (p. 91-114), e apresenta observações conhecidas, mas que é sempre bom lembrar. Esclarece, por exemplo que, na expressão «nova evangelização» não é o Evangelho que muda; mas pode mudar o modo de divulgar a mensagem. E também que esta insistência na (Nova) Evangelização não fica a dever-se à provocação do secularismo, mas deriva do mandato do próprio Cristo de levar o Evangelho a toda a criatura. É, portanto, de fundo, e não de superfície. Apela bem a que a pastoral reveja a posição do sacramento da Reconciliação e da direcção espiritual, colocando-os no centro da sua acção. Fala bem do sentido de identidade e pertença à comunidade, e da importância da catequese. Afirma a importância de uma nova antropologia, mas o texto parece-me pouco ousado. Encontra-se, neste apartado, porém, do meu ponto de vista, a frase mais incisiva do livro: «nunca poderemos pensar numa fé forte ao lado de uma razão fraca» (p. 113).
13. O Capítulo VII intitula-se «Os novos evangelizadores» (p. 115-136), e elenca o bispo, enquanto sucessor dos apóstolos, mas chama bem a atenção para o facto de esta missão ser participada e partilhada pelos sacerdotes, que juntamente com o bispo formam o unum presbyterium, ou seja, um único corpo sacerdotal ao serviço do povo de Deus, e salienta a necessidade de a Igreja ter de ter bons sacerdotes, santos, e bem preparados. Reclama ainda a importância do testemunho dos consagrados para a evangelização e a vida missionária, bem como o papel imprescindível dos fiéis leigos no coração do mundo.
14. Os últimos Capítulos são dedicados à importância da beleza, merecendo destaque neste contexto a Catedral, que deve ser uma Bíblia aberta e um compêndio aberto de arte cristã, em que as pedras e os vitrais falem tanto como o bispo. D. Rino Fisichella apresenta como ícone da Nova Evangelização a Sagrada Família de Gaudí, em Barcelona, templo quase alucinatório, levantado do chão pelo povo e pelo génio de Gaudí. Levantado do chão para nos fazer chegar até Deus. Ou o diálogo do poeta e do pedreiro. Pergunta o poeta: «Que fazes, amigo?». «Corto uma pedra», responde o primeiro. Um pouco mais à frente, o poeta repete a pergunta a outro pedreiro, que responde: «ajudo a erguer uma coluna». Mais adiante, a mesma pergunta é dirigida a um terceiro pedreiro, que responde: «Estou a construir uma catedral!» (p. 171). Passa por aqui, pela afinação desta caixa de velocidades, a Nova Evangelização.
15. O Livro é acessível a todos. Oportuno para este tempo em que a Igreja prepara o Sínodo sobre «A nova evangelização para a transmissão da fé cristã». Ajuda a despertar a consciência cristã contra todas as indiferenças paralisantes.
+ António Couto, Bispo de Lamego

Rino FISICHELLA, A Nova Evangelização. Um desafio para sair da indiferença, Lisboa, Paulus Editora, 2012, 175 p.

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